quarta-feira, 28 de maio de 2014

Amizades de São Francisco

         Encontrar uma verdadeira amizade é, segundo as Escrituras, encontrar um tesouro. Na sua vida, São Francisco experimentou o significado de tão belo ensinamento. De fato, ele pôde contar sempre com a amizade de Clara, de Frei Leão e de vários outros companheiros. Falaremos agora sobre a amizade de Francisco com duas mulheres de Roma: Jacoba e Praxedes.
 
                                                      Jacoba de Settesogli
No Tratado dos Milagres, o Frei Tomás de Celano nos oferece algumas informações sobre esta amiga do seráfico pai: “Jacoba de Settesogli, ilustre, seja por sua nobreza, seja por sua santidade, na cidade de Roma, merecera o privilégio de uma afeição toda particular da parte do santo” (3Celano 37,1).

Estando gravemente enfermo, e sabendo que iria morrer em breve, o pai Francisco mandou escrever uma carta à Senhora Jacoba “comunicando-lhe que se apressasse, caso desejasse ver aquele a quem tanto amara, o exilado, que estava para retornar à sua pátria” (3Celano 37,3). Antes do mensageiro sair com a carta, chega uma comitiva com a Senhora Jacoba para visitar o santo. Ele se alegrou de tal forma que disse aos frades: “Bendito seja Deus, que nos enviou o nosso irmão, Senhora Jacoba! Abri as portas e introduzi-a, pois o decreto que proíbe a entrada de mulheres não vale para Frei Jacoba” (3Celano 37,8-9).
Um detalhe importante é descrito por Celano: “Tudo quanto a carta pedia que fosse trazido para as exéquias do pai esta santa mulher o trouxera. Um pano cinza para cobrir o corpo moribundo muitas velas, um sudário para cobrir o rosto, um travesseiro para a cabeça, e mesmo algumas iguarias de que o santo gostava. Tudo o que o espírito desse homem desejara Deus havia trazido” (3Celano 38,3). O biógrafo diz que a presença desta nobre senhora “deu mais força ao santo, e havia a esperança de que ele viveria ainda um pouco mais” (3Celano 38,6).

Poucos dias depois morre o santo pai. A senhora Jacoba permaneceu até os últimos momentos ao lado do amigo querido. Frei Elias, o Vigário de São Francisco, entregou o corpo do santo para que a distinta senhora pudesse contemplar melhor aquele que se tornara imagem de Cristo aqui na terra. Disse-lhe o Frei Elias: “Eis aqui, toma nos braços, depois de morto, aquele a quem amaste quando vivo” (3Celano 39,1b). E Tomás de Celano afirma que ela, afastando o sudário, viu as cinco chagas de Cristo esculpidas na carne do bem-aventurado pai, e que esta contemplação trouxe-lhe grande consolação.
São Boaventura nos conta que São Francisco, em certa ocasião, passando por Roma, deixou um cordeirinho aos cuidados da Senhora Jacoba, e que “o cordeiro, como se tivesse sido instruído pelo santo nas coisas espirituais, ligou-se à senhora como companheiro inseparável quando ela ia à igreja, quando lá permanecia e quando retornava” (LM 8,7).
Quando visitamos o sepulcro de São Francisco, podemos ver na mesma cripta o lugarzinho onde estão os restos mortais desta santa mulher tão dedicada ao Pobrezinho
                                                                        Praxedes
O Frei Tomás de Celano também nos informa que São Francisco foi amigo de uma eremita romana, chamada Praxedes. Era uma mulher que vivia na reclusão de uma pequena cela, dedicando-se dia e noite à oração, ao silêncio e à penitência.
No Tratado dos Milagres, Celano fala brevemente sobre esta mulher e de sua relação com o seráfico pai:
“Praxedes era muito famosa, tanto entre as religiosas de Roma quanto em todo o território romano, porque desde a mais tenra idade, por fidelidade para com seu Esposo eterno, se recolhera numa cela estreita, já passados quase quarenta anos. Mereceu o privilégio de uma santa familiaridade para com São Francisco. O que este não fizera a nenhuma outra mulher, fez com ela, aceitando-a à obediência e concedendo-lhe, por piedoso devotamento, o hábito religioso, isto é, a túnica e o cordão”. (3Celano 181, 1-2).
Certo dia, sofrendo uma terrível queda, Praxedes teve vários ossos quebrados, ficando praticamente paralisada sobre o chão. Como a eremita não queria renunciar de nenhuma maneira o seu voto de perpétua clausura, mesmo sendo aconselhada por um cardeal, não aceitou a presença de outras pessoas que pudessem socorrê-la.
Então ela voltou-se para São Francisco e implorou o seu auxílio: “Ó santíssimo Pai meu, que em toda parte socorres com bondade às necessidades de tantos, que nem sequer conhecias quando vivo, por que não vens em auxílio desta infeliz, que, mesmo que indignamente, teve o privilégio da tua amizade, enquanto vivias? Realmente, faz-se necessário, como vês, ó Pai, ou mudar o meu voto, ou, então, sofrer o juízo da morte”. (3Celano 181, 8-9). Depois deste lamento, ela caiu num sono profundo e viu São Francisco que vinha até ela, dizendo: “Levanta-te, filha bendita, não temas! Recebe o dom da completa saúde e conserva inviolável o teu voto”. (3Celano 181, 11b-12). Assim, quando ela acordou, percebeu que estava totalmente curada, e pôde levantar-se e andar como antes.
Esta amizade, mesmo que descrita de forma muito breve por Tomás de Celano, parece ter sido intensa. Esta conclusão é confirmada pelas fortes expressões utilizadas pelo autor: “Mereceu o privilégio de uma santa familiaridade para com São Francisco”; e “Por que não vens em auxílio desta infeliz, que, mesmo que indignamente, teve o privilégio da tua amizade, enquanto vivias?”.
Através destes relatos podemos enxergar um santo que não teve medo dos mais nobres sentimentos humanos. Já estando liberto dos apegos egoístas, pôde cultivar nobres amizades que alegraram seu espírito até mesmo nos seus últimos instantes.

 Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.

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